Como você percebe que a sua saúde mental não está bem? Você já parou para refletir sobre quais foram as primeiras alterações que o estresse intenso (principalmente prolongado) provocou na sua vida?
Há três áreas frequentemente afetadas (aumentadas ou reduzidas) quando a saúde mental e a resiliência ao estresse estão fragilizadas: a alimentação, a libido e o sono. Estas condições são uma espécie de termômetro de que algo não está bem, e por isso, precisam ser monitoradas, principalmente quando as alterações são persistentes. Hoje abordaremos o sono, um processo biológico que desempenha papel fundamental na manutenção da saúde e da vida.
Qual a importância do sono?
É durante o sono que uma série de funções cerebrais e sistêmicas são reguladas, incluindo o funcionamento dos sistemas imunológico, metabólico, neuroendócrino, hormonal, e cardiovascular (1, 2). Disfunções neste processo afetam a atividade do sistema nervoso simpático, do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal e do ritmo circadiano, alterando o metabolismo e as respostas pró-inflamatórias.
Quais as consequências das alterações do sono?
A curto prazo, alterações no sono aumentam a reatividade ao estresse e a dor, além de serem relacionadas a níveis elevados de ansiedade, tristeza, esgotamento, e a déficits na cognição (afetando a memória, o desempenho cognitivo e a capacidade de resolver problemas). Já alterações crônicas tem sido relacionadas ao desenvolvimento de hipertensão, dislipidemia, ganho de peso, problemas gastrointestinais, síndrome metabólica e diabetes, além de aumentar o risco para o desenvolvimento de alguns tipos de câncer (1). O sono insuficiente também pode contribuir para alterações no sistema de resposta neuroendócrina ao estresse, levando ao desenvolvimento de transtornos mentais, principalmente relacionados a ansiedade, humor e depressão (3).
Dormir mal é doença?
Possivelmente uma grande parte das pessoas irá manifestar perturbações transitórias no sono em algum momento, isso é comum quando a higiene do sono é inadequada, em momentos de estresse intenso e durante algumas doenças (gripe, por exemplo). A preocupação deve surgir se os problemas estiverem trazendo sofrimento, atrapalhando a vida e a produtividade, ou se persistirem por um tempo prolongado.
Há diversas desordens do sono. A característica comum entre elas é a insatisfação com a quantidade ou a qualidade do sono. Frequentemente há dificuldade para iniciar e/ou manter o sono, e em despertar e/ou se manter acordado. Consequentemente, pessoas que sofrem com estes problemas se sentem constantemente cansadas e irritadas. Assim, é muito comum que isso seja acompanhado de sintomas psicológicos como a depressão, ansiedade e alterações cognitivas, como abordamos anteriormente (4).
Há dez diferentes tipos de transtornos do sono, o mais conhecido é o Transtorno de insônia, mas além dele há o transtorno de hipersonolência, narcolepsia, transtornos do sono relacionados à respiração, transtorno do sono-vigília do ritmo circadiano, transtornos de despertar do sono não REM (rapid eye movement – movimentos rápidos dos olhos), transtorno do pesadelo, transtorno comportamental do sono REM, síndrome das pernas inquietas e transtorno do sono induzido por substância/ medicamento (4). Cada uma destas condições tem características específicas (você pode ler mais clicando aqui). A identificação dos sintomas e da causa do transtorno do sono (Burnout, ansiedade, obesidade, alterações na respiração, doenças endócrinas, entre outras) é fundamental, pois irá subsidiar a indicação terapêutica que poderá envolver médicos do sono, psicólogos, neurologistas, psiquiatras, endocrinologistas entre outros.
Apesar de perturbações nestas esferas serem corriqueiras, e afetarem consideravelmente a saúde e a qualidade de vida, não é incomum que elas sejam subestimadas pelas pessoas, ou mesmo por profissionais da saúde pouco familiarizados com esta temática.
Profissões marcadas pela pressão intensa e por altos índices de estresse e competitividade podem apresentar índices elevados e transtornos do sono, entre elas está o Direito (5). No I Mapeamento de Saúde da Caixa dos Advogados do Rio Grande do Sul, a sonolência esteve entre as principais queixas relacionadas a saúde mental, relatada por mais de 50% dos advogados, superada apenas do estresse (uma condição que frequentemente está na origem das alterações do sono)(6). Isso nos sinaliza que se trata de uma área problemática e que precisa ser abordada, já que implica diretamente na saúde e na qualidade de vida dos advogados.
Na próxima semana daremos sequência a este assunto. Enquanto isso fica a reflexão: Como está a qualidade do seu sono?
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por Felipe Ornell, psicólogo
Fontes
1. Medic G, Wille M, Hemels ME. Short- and long-term health consequences of sleep disruption. Nat Sci Sleep. 2017;9:151-61.
2. Zielinski MR, McKenna JT, McCarley RW. Functions and Mechanisms of Sleep. AIMS Neurosci. 2016;3(1):67-104.
3. Meerlo P, Sgoifo A, Suchecki D. Restricted and disrupted sleep: effects on autonomic function, neuroendocrine stress systems and stress responsivity. Sleep medicine reviews. 2008;12(3).
4. APA. Diagnostic and Statistical Manual of Mental disorders (DSM-5). Washington: American Psychiatric Association; 2013.
5. Krill PR, Johnson R, Albert L. The Prevalence of Substance Use and Other Mental Health Concerns Among American Attorneys. J Addict Med. 2016;10(1):46-52.
6. Bee-Touch. I Mapeamento de Saúde da Caixa dos Advogados do Rio Grande do Sul. 2018.
Psicólogo clínico, possui Residência em Saúde Mental (ESPRS) e especialização em Dependência Química; Mestre e Doutorando em Psiquiatria e Ciências do Comportamento (UFRGS). Pesquisador no Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas - Hospital de Clínicas de Porto Alegre / Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Editor da Revista Brasileira de Psicoterapia. Professor titular do curso de Psicologia da Faculdade IBGEN, Grupo Uniftec e responsável técnico pelo Previne Saúde Mental.
E-mail: felipeornell@gmail.com
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